Dra. Débora Christina Ribas D'Ávila

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16/07/2011

AS MÃES REFÉNS DO CRACK - Revista Veja - Ricardo Westin

AS MÃES REFÉNS DO CRACK


Revista Veja - Ricardo Westin

O crack causa uma devastação na vida de pais e mães dos dependentes. Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz indica que há hoje 1 milhão de viciados nessa droga no Brasil. Está presente em 98% dos municípios brasileiros. O crack subiu a escala social - estudantes universitários, empresários, advogados e até médicos.

Nenhuma droga danifica o cérebro com tanta rapidez. O viciado perde completamente o senso de julgamento e a responsabilidade. Fica agressivo. O viciado não se importa em passar dias ou semanas morando na rua. Diz Wagner Giudice, delegado do Departamento de Investigações sobre Narcóticos da Polícia Civil de São Paulo.

Um filho viciado em crack desestabiliza toda a família. As tentativas de impedi-lo de sair de casa não funcionam. Se as portas são trancadas, ele pula as janelas. Pega escondido o carro. Muitos pais passam noites em claro, esperando o telefone tocar - as ligações mais temidas são do hospital, da polícia e do necrotério. Alguns se arriscam procurando o filho nas cracolãndias pela madrugada. A promessa de que ele vai deixar o vício sempre soa sincera, mas nunca é cumprida. Os pais carregam seu tormento para o trabalho e para a vida social. A vida gira em torno do viciado. Muitas vezes o patrimônio familiar é dilapidado com caras e prolongadas internações em clínicas de desintoxicação. Um mês de estada nas melhores clínicas custa 20.000 reais.

O crack é uma forma mais potente de cocaína. Os efeitos de ambas as drogas são os mesmos: bem estar, energia e euforia. Essas sensações se devem ao cloridrato de cocaína, seu princípio ativo, que, chegando ao cérebro, libera dopamina, o neurotransmissor responsável pela sensação de prazer. A dopamina é liberada naturalmente pela comida e pelo sexo. A probabilidade de um iniciante se viciar em crack é o dobro da de se viciar em cocaína. A "brisa" do crack, como dizem os viciados, surge em dez segundos e se esvai em dez minutos. O efeito da cocaína leva alguns minutos para começar e se prolonga por até uma hora. Normalmente, basta uma semana para que a pessoa já não consiga ficar sem o crack. Com a cocaína, o vício leva meses para se estabelecer. Tanto o crack quanto a cocaína entram no Brasil em forma de pasta-base de coca, produzida na Colômbia, na Bolívia e no Peru. Os traficantes montam laboratórios caseiros perto dos pontos de venda para transformar a pasta-base em cocaína ou crack, conforme a demanda.

Há mais de cinquenta doenças desencadeadas pelo uso de crack: psiquiátricas, cardíacas, respiratórias e renais, entre outras. O enfisema pulmonar leva três décadas para se manifestar num fumante e poucos anos no usuário de crack. Para se recuperar do vício, o dependente precisa passar por um longo processo, que inclui internações, tratamento das doenças associadas, consultas frequentes com psiquiatra e psicólogo e atividades que ajudem a reinseri-lo na família e na sociedade. Também é útil participar de grupos de autoajuda, como os Narcóticos Anônimos. Já os pais e as mães do crack raramente contam com ajuda, orientação ou tratamento. Tendem a se afundar na dor, na raiva, na culpa e na vergonha. É por causa da vergonha das famílias que as ambulâncias que fazem as internações involuntárias têm mais trabalho durante a madrugada - assim, não se corre o risco de que os vizinhos descubram que o filho está doente.

A psicóloga Maria de Fátima Padin, da Universidade Federal de São Paulo ouviu 500 familiares de viciados e ex-viciados de São Paulo, principalmente das classes A e B. Em média, os pais levaram dois anos e meio para procurar algum tipo de ajuda. As principais razões para a demora:
não sabiam o que fazer (30%),
acharam que conseguiriam resolver o problema em casa (24%) 
pensaram que o uso de drogas seria passageiro (17%).

Apenas 11 %, acertadamente, pediram auxílio de um psiquiatra. Os grupos de apoio e as igrejas podem ser importantes na recuperação do viciado ­mas só depois que ele já passou por cuidados médicos e se desintoxicou.

Na prática, o único tipo de ajuda com o qual os pais e as mães podem contar são os grupos de apoio específicos para familiares de de­pendentes químicos. Os maiores são o Nar-Anon e o Amor Exigente.

Neste ano, a polícia de São Paulo apreendeu pela primeira vez o óxi, uma espécie de crack ao qual se acrescentam na preparação ingredientes baratos e perigosos como cal virgem, ácido bórico, ácido sulfúrico, gasolina e querosene. 

Um milhão de brasileiros são dependentes da mais perigosa das drogas. Ela não só acaba com a vida deles: é devastadora para as famílias

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